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Posts Tagged ‘Exposições’

Fotografia: Museu Bordalo Pinheiro

Agradecemos a todos os que estiveram presentes, assim como aqueles que, sabendo do evento, não puderam comparecer. Seja por razões de ordem particular ou por quaisquer outras. Na passada sexta feira, com a participação do escritor Alexandre Sarrazola, confluimos pelo diálogo em torno das edições Quarto de Jade, no Museu Bordalo Pinheiro, onde estamos a expor livros e originais até dia 7 de Janeiro.

Assumimos, nestes dez anos, os livros que fazemos como entidades organicamente coerentes ao se apresentarem na sua individualidade, aparentando-se não como sucedâneos mas vozes de um corpo comum. Um pouco como uma pequena floresta que se vai ordenando pelas suas características naturais, encontrando o seu equilíbrio. Por isso nunca partimos de uma estratégia editorial à priori ou de um modelo gráfico uniformizado. Para nós, cada livro obedece ao ritmo das suas particularidades temporais e processuais, para finalmente amadurecer e tomar forma ficando disponível aos seus leitores.

Ao longo deste tempo podemos reconhecer duas vertentes nos livros que publicamos: O livro como objecto e a narrativa gráfica como ensaio. Naturalmente, um livro por si só já é um objecto. No entanto, estes tomam uma forma particular no caso dos exemplares de Maria João Worm: nos três primeiros livros é pedido ao leitor que não se limite a ler mas que intervenha no livro gestualmente, abrindo-o, por exemplo, num desdobrável de folha única; noutro caso, em harmónio também podendo ser folheado ou o convite de transformar a publicação através de recorte, para dar forma a quatro cubos que se desdobram por três imagens, acompanhando o ritmo de um pequeno poema. Nos restantes, mesmo no caso da forma regular das páginas que se folheiam, os livros desta autora têm sempre uma intervenção original ou particular. Tanto no manuseamento táctil através da colagem de estampas, bem como por intervenções directas de monotipias ou pequenas ilustrações particularizando cada exemplar, dentro da tiragem dessa edição.

Fotografia: José Frade/EGEAC

Dentro desta linha, na qual cada livro que fazemos e publicamos tem a sua individualidade própria, o trabalho de Diniz Conefrey apresenta-se com frequência no campo da narrativa gráfica. Correntemente denominada por banda desenhada, desde sempre tivemos a impressão que esta linguagem pode ser tudo o que fizermos dela. Até porque a sua riqueza reside na circunstância de se tratar de uma forma de arte híbrida – balanceando entre os princípios da narrativa escrita e da narração visual – surgindo aos leitores com mais enfâse na simbiose entre ambas mas tendo como possibilidade linguística abordagens de maior ambiguidade estética.

Nesse sentido, procuramos na narratividade um contraponto ao modelo mais corrente, sujeito à “tirania da intriga”, ligado a uma estrutura próxima do romance: há um equilíbrio inicial, um incidente incitante que rompe esse equilíbrio, um conflito e, no final, o retomar de um novo equilíbrio. Se tivermos em conta que no universo musical, por exemplo no jazz moderno, um tema tem as suas ressonâncias próprias mesmo que não inclua “letras”, então, mesmo imagens que não sejam figurativas desencadeando uma dramaturgia sequencial poderão estar a confluir para uma diegese cuja matiz se desenvolve noutro campo mais próximo a uma meta-linguagem. Daí o interesse no abstraccionismo, enquanto expressão concreta de modulação narrativa, ou o diálogo desta com a figuração naturalista. Podendo apresentar-se, também, em complementariedade com a palavra escrita – ou não. Estas zonas levantam, quanto a nós, aspectos inerentes à narrativa gráfica mais próximas das nuances intimistas e temporais presentes em poemas que, ao não contar, se desenrolam como uma espiral em suspensão. Nesse sentido poderíamos dizer que um poema é uma imagem que fala, e uma imagem um poema silencioso.

Para nós um livro é uma expansão delicada, reflectindo um olhar de vivência por horas de trabalho solitário para finalmente tocar, através da partilha, quem o queira receber num espaço de encontro comum.

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A exposição que vamos apresentar no Museu Bordalo Pinheiro, com início a 13 de Outubro de 2021, insere-se no âmbito comemorativo dos dez anos de existência do selo editorial Quarto de Jade, complementando a exibição Entre Mundos, que decorreu entre Maio e Junho na Livraria-Galeria Tinta nos Nervos.

Se na primeira mostra, desta colaboração entre a Livraria e o Museu, a incidência foi no trabalho gráfico individual dos autores Maria João Worm e Diniz Conefrey, agora a exposição Ouvido Interno – orgão do qual resulta o logótipo da Quarto de Jade – circunscreve-se exclusivamente a originais ou livros que foram publicados na chancela editorial que ambos partilham.

Ficam desde já convidados a visitarem esta resenha da nossa deriva editorial. Em complemento, disponibilizamos o link para a exposição A Flor da Pele no nosso site: http://www.quartodejade.com/gallery_exhibitions.php?id_authors=1

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E se as palavras forem desenhos inscritos dentro das formas do que designam?

Uma vez reconhecida esta possibilidade, pode-se assistir à conversa das letras. E são múltiplas as conjugações com a matéria perecível. Perante a sobreposição opaca fica a opção de escolher, reenquadrar com o sentido do gesto que a cada ser pertence.

Corpo, astro, molusco, ínfima parte, rotação de letras. Pensamento.

Em silêncio, o corpo deitado imóvel, tem a delimitação do barco e a carnação de uma ilha que avista ao largo a passagem de frases feitas construídas em estaleiros.

E de onde vêm estas imagens que se constroem por si? Eficazes como o arpão, as redes e o anzol. Mas o mar tem o horizonte e é indiferente às linhas rectas com que as quilhas dos barcos cortam o espaço.

Falta uma palavra, escondeu-se debaixo da língua. No palco escuro do quarto revestido a ardósia deixa de chiar o giz, separa-se o objecto do manipulador. Falha a memória do nome, mas não o que se sabe dele.

E a cabeça compete consigo própria, como nos ensinaram na escola para reproduzir na Vida.

E é assim tão importante a rapidez da resposta?

Estando a palavra debaixo da língua não poderá encontrar-se no lugar que permite a passagem para outro significado?

Acordámos as palavras e elas despertam-nos.

Enquanto os livros no escuro, de costas voltadas para o mundo, afirmam as lombadas duras e carreiros de letras em linha recta para evitar que nos percamos tão facilmente.

De volta ao desenho, à chave, ao reconhecimento, ao que esteve sempre lá, antes de o sabermos nomear.

Se me falha a palavra, como te digo o que penso?

Conto uma história acerca dela e no centro do espaço vazio, a sua ausência toma forma ao se deixar revestir pelo esforço que a faz alumiar-se. Aí está a palavra, a que procuro, a que me faz girar em torno dela, como um planeta à volta de uma estrela.

Um outro tempo, uma flutuação, o que para a ostra é uma vida inteira, e com ela tudo o que existe partilhamos. No ínfimo, a dança dos átomos.


Do catálogo «O barqueiro com a palavra debaixo da língua». Maria João Worm, 2016.

 

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Por ocasião do 10º aniversário da existência do Quarto de Jade, selo editorial dos autores Maria João Worm e Diniz Conefrey, a Livraria/Galeria Tinta nos Nervos apresenta a exposição «Entre Mundos», de dia 25 de Maio a 6 de Junho, em cooperação com o Museu Bordalo Pinheiro/EGEAC.

Esta será uma selecção judiciosa de trabalhos éditos e inéditos de ambos os autores, que se têm desdobrado nas áreas das artes visuais, banda desenhada, ilustração, e as artes dos múltiplos, por vezes  em colaboração directa, ainda que as afinidades se façam sentir através das obras mono-autorais da sua chancela editorial. Encontraremos um conjunto de quase duas dezenas de imagens nas mais díspares valências, empregando técnicas mistas onde se cruzam materiais  e suportes, alguns usuais, outros incomuns; intervenções e colagens além de originais em gravura. Oscilando entre o figurativo e o abstracto, o icónico e o poético, o narrativo e o ambíguo, há aqui uma verdadeira constelação cujos extremos poderão dar a ideia de mundos distintos, mas que se ligam por elos subtis.

A cooperação com o Museu Bordalo Pinheiro/EGEAC consubstanciar-se-á numa segunda exposição naquela instituição, com trabalhos diferentes, dos autores, em data a anunciar.

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A consciência do tempo levou-me ao cinema de animação na Escola António Arroio, um gosto  pela sequencialidade, a rima, ouvir e contar histórias,tendência para me encantar com frisos de iluminuras ou letras capitulares.
Depois fiz um curso técnico/profissional de cerâmica: um reencontro com a consequência táctil do gesto e subsequente afinidade com unhas sujas. De escultura no Porto transferi-me para pintura na Faculdade de Belas Artes de Lisboa: a questão da luz e a conversa das cores.
Colaborei em revistas, livros e jornais, publicando ilustrações e narrativas gráficas. Tenho usado a técnica da linogravura, para mim é um encontro feliz entre escultura e pintura, nela se acresce o reflexo enquanto poesia aplicada. Das exposições de pintura e gravura destaco A colecção particular  “A” em 2006 na galeria Monumental e a A Fonte das Palavras em 2013 na Casa das Histórias Paula Rego. Em 2011 recebi o Prémio Nacional de Ilustração, com o livro Os Animais Domésticos, edições Quarto de Jade. Foi muito importante para mim ter dado aulas, pela reciprocidade que um espaço de ensaio permite quando se procura a afinação de cada um consigo próprio, para comunicar com os outros.

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A livraria Mundo Fantasma abre portas dia 4 de Maio, das 10h00 às 20h00, para mais um Free Comic Book Day, celebrado por todo o mundo no primeiro Sábado de Maio. À iniciativa acrescem outras dinâmicas, organizadas pelo atelier 3|3 e pela livraria, tais como a realização de um Mercado de Edições, dando realce a diversos géneros de edição de autor; a exposição Histórias Gravadas, com pranchas das edições Quarto de Jade (Maria João Worm e Diniz Conefrey); e o lançamento do disco Vida Nova de Manuel Cruz, o segundo álbum editado pela independente Turbina. Haverá ainda lugar para a experimentação de técnicas de carimbagem para um fanzine, numa banca montada para esse efeito. Também haverá oportunidade para aquisição dos últmos exemplares do “Diário Rasgado 2007-2012” de Marco Mendes, com a presença do autor.

A Exposição Histórias Gravadas, inaugura nesse dia com a presença dos autores Maria João Worm e Diniz Conefrey.
A Quarto de Jade ganhou forma com a edição do livro Os Animais Domésticos, em 2011, logo após a edição de Electrodomésticos Classificados. A sua linha editorial deriva da articulação entre a palavra e a imagem emergindo de um sentido poético. Nesta exposição destacam-se desenhos preparatórios, matrizes, tanto em linóleo como em madeira, e provas de estado, referentes ao último livro por nós publicado: Planície Pintada. Também se apresentam uma série de gravuras desafiando a que se pense sobre o que seres sencientes poderão, eventualmente, sentir Nas Lojas que Vendem Animais. Esta exposição estará patente até ao final do mês de Junho.

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Inaugura no dia 25, sexta-feira, às 21h00, na Casa da Cultura, o Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja que se realiza entre os dias 25 de Maio e 10 de Junho do ano corrente. Uma boa parte das exposições estarão patentes no Centro Unesco, no Forno da Ti Bia Gadelha, na Galeria da Rua dos Infantes, no Museu Regional de Beja, no Núcleo Museológico da Rua do Sembrano, no Palacete Vilhena – Sede do EMAS, e no Pax Julia – Teatro Municipal. São 8 os núcleos expositivos e 21 as exposições, com autores de muitas partes do Mundo: Brasil, Espanha, França, Itália, Portugal e Suécia. O Festival oferece ainda aos visitantes uma Programação Paralela bastante diversificada: apresentação de projetos, conversas à volta da narrativa gráfica, lançamento de livros – este ano serão 16 -, sessões de autógrafos, concertos desenhados. Terá também à disposição de todos o Mercado do Livro, com mais de 60 editores presentes e venda de arte original. O primeiro fim-de-semana (25, 26 e 27 de Maio) reunirá os autores representados nas exposições.

Para mais informações consultar: http://www.festivalbdbeja.com/

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David A. Carter, 600 Black Spots. Nova Iorque: Little Simon, 2007.

Campo Grande, de 17 Maio a 9 Setembro de 2016.

«Esta exposição resulta do encontro de dois coleccionadores de livros. André Garcia Pimenta colecciona livros mecânicos. Catarina Figueiredo Cardoso colecciona livros de artista e de edição independente. Confrontando as suas colecções, concluíram que estas se interseccionavam precisamente nos livros mecânicos. E são complementares: enquanto André Garcia Pimenta colecciona livros mais antigos, desde o início dos livros mecânicos, Catarina Figueiredo Cardoso colecciona livros contemporâneos.

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Harold Lentz, The Pop-Up Pinocchio. Nova Iorque: Blue Ribbon Books,1932.

«Pop-up» («aparecer» ou «surgir» em português) é o termo inglês utilizado universalmente para designar livros em que a abertura de uma página dupla provoca um movimento que faz com que elementos recortados, dobrados e colados se levantem para formarem uma figura tridimensional. Reciprocamente, o fechar da página faz colapsar a figura tridimensional, regressando o livro ao seu aspecto tradicional de códice fechado. O termo «pop-up book» foi registado em 1932 pela editora nova-iorquina Blue Ribbon, com o livro Pinocchio de Harold Lentz.

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Raphael Urwiller, Mayumi Otero, Momotaro. Estrasburgo: Icinori, 2011.

Os livros pop-up podem ser muito simples ou de uma enorme complexidade, livros únicos ou grandes produções de centenas de milhares de exemplares usando sofisticadas técnicas de corte e de impressão. Mas a sua montagem é sempre um processo manual.

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Ernest Nister, The Land of Long Ago. Londres: Ernest Nister, 1898.

A exposição está organizada em três partes.

A primeira parte apresenta exemplos clássicos de pop-ups. Alguns são livros do Séc. XIX, outros da primeira metade do Séc. XX. São também clássicos pelos temas que tratam: o mundo das crianças, contos infantis, abecedários e numerários.

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Jean-Charles Trebbi, Angel Dance. Nº1/10. Pountault Combault (França): o autor, 2011.

A segunda parte é dedicada a artistas contemporâneos especialmente importantes no contexto da produção industrial de pop-ups, e a artistas que usam o pop-up como componente relevante da sua prática.

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Matthew Reinhart & Robert Sabuda, Folha de produção de Dragons & Monsters.

A terceira parte mostra o lado escondido do pop-up industrial: maquetes e esboços, as folhas impressas com as peças, os cortantes.» (Excerto do texto da folha de sala) André Garcia Pimenta – Catarina Figueiredo Cardoso.

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S. Louis Giraud, Daily Express ABC. Londres: S. Louis Giraud, 1932.

 

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Ug (Philippe Ug), Pixomatic. Nº47/100. Liancourt (França): o autor, 2008.

 

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Catarina Leitão, Uplift. Nº5/5+1PA, assinado pela autora. Nova Iorque: a autora, 2008.

 

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Damien Schevaert-Brossault, Farandole Celeste. Nº1/8, assinado pelo autor. Vitry sûr Seine (França): Imaginalia, 2010.

 

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Matthew Reinhart, Robert Sabuda, Dragons & Monsters: miolo do livro. Assinada.

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Cartaz-Facebook

O Festival de BD de Beja 2016 realiza-se este ano entre os dias 27 de Maio e 12 de Junho, celebrando a sua 12ª edição.

Desta vez num novo formato, abraçando exclusivamente o Centro Histórico da cidade. O Festival inaugura no dia 27 de Maio, sexta-feira, às 21h00 horas, no Pax Julia – Teatro Municipal, o núcleo principal deste encontro dedicado à banda desenhada, e onde se centrarão boa parte das exposições e da programação paralela. Destacamos aqui a exposição dedicada à chancela editorial Quarto de Jade, apresentando diversos originais que fazem parte dos livros até agora publicados; além de esboços e outro material preparatório.

Nessa mesma noite (e na seguinte) o evento encerra às 3h30 da manhã, já que a programação será ocupada com os Concertos Desenhados no Largo do Museu Regional (mesmo ao lado do Pax Julia).

O primeiro fim-de-semana (27, 28 e 29 de Maio) será completamente preenchido com a apresentação de projetos, sessões de autógrafos, conversas, concertos desenhados, lançamento de livros, workshops, etc., e reunirá todos os autores representados nas 23 exposições patentes ao público.

Dia 28 de Maio, sábado, na cafetaria do Pax Julia – Teatro Municipal, a Quarto de Jade apresentará às 15.45h o livro «Meteorologias» de Diniz Conefrey e das 18.00h às 19.30h estaremos presentes no Largo do Museu Regional para uma sessão de autógrafos no Mercado do Livro. Todos os nossos títulos vão estar disponíveis para venda na banca da livraria Dr Kartoon.

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Links para mais informações:

Catálogo descritivo das Edições Quarto de Jade.

Exposição virtual de «Os Labirintos da Água» e «O Livro dos Dias».

Loja de Livros do site Quarto de Jade. Nos PDF’s poderão aceder a duas páginas das respectivas publicações.

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LMG

A propósito da recente exposição de Luis Manuel Gaspar na Galeria Acert, em Tondela, transcrevemos um pequeno texto da autoria de Rosa Maria Martelo sobre a obra deste poeta ilustrador. A exposição ainda pode ser apreciada até ao dia 20 de Abril do corrente ano:

Associação Cultural e Recreativa de Tondela Rua Dr. Ricardo Mota, 18; 3460-613 Tondela.

Oganização da ACERT, em colaboração com o Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa.

 «”Compreender é associar, para a inteligência não há melhor exercício do que a imagem”, escreveu Jean Epstein. E os trabalhos de Luis Manuel Gaspar dão-lhe certamente razão. Entre a natureza e a máquina, entre o humano e o não humano, certas imagens desta exposição descobrem nexos que se fortalecem do prévio afastamento que vêm desfazer. Encontramos o planisfério terrestre nas manchas da quitina de um artrópode, flores que se humanizam num sexo, seres humanos que adquirem traços de um insecto ou de um crustáceo, uma cabeça que também é uma lâmpada e um olho, tecidos cujas dobras se desfazem em folhagem, rostos que admitem uma visão subcutânea, madeixas de cabelo a lembrarem patas de aranha… Tudo desenhado com o máximo rigor, mas entre uma figuração realista e a transfiguração anti-realista resultante das conexões improváveis que nos são reveladas. Se estas imagens nos parecem “muito lentas”, como disse António Barahona, é porque precisamos de as decompor, de analisá-las a partir das sensações contraditórias que produzem em nós. E nesse exercício revelam-se as palavras que as habitam. Muitos dos desenhos de Luis Manuel Gaspar subentendem as palavras da poesia. Não apenas porque a surpresa que provocam pode resultar de articulações metafóricas, de um tropo que liga dois reinos para produzir um terceiro, mas também porque, em muitos casos, os desenhos se destinaram a acompanhar poemas, ou partiram de textos; e ainda porque, nas pranchas dedicadas a vários poetas, encontramos as imagens que Luis Manuel Gaspar quis que víssemos nos versos reproduzidos, ou a par deles. É um mundo onde as imagens da poesia e as imagens visuais se interpelam mutuamente. Livremente. Um mundo para ver, ler e imaginar. Fluido, delicado, irónico e inquieto. E cheio de gravidade.»

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Aproveitamos também para publicar as respostas de Luis Manuel Gaspar ao questionário de Sara Figueiredo Costa para a agenda da ACERT, aquando da programação cultural referente ao período de Janeiro-Março de 2016:

-Parte do teu trabalho de ilustração pode ser visto em capas de livros de poesia. Como decorre esse processo de criar uma imagem que sirva de porta para um universo que se desdobra em tantos pedaços?

O maior desafio é tentar encontrar uma imagem que provoque uma impressão semelhante à que ficou da primeira leitura dos versos, seja essa impressão de mistério, violência ou viagem… A ilustração da capa deve ser exactamente uma porta, que apresenta os poemas mas os deixa intocados para a leitura.

-A tua relação com a poesia não se limita ao trabalho de capista, passando pela edição crítica, pela divulgação, até pela prática. Quase como o «Barnabé», de Sérgio Godinho, o que é que tem a poesia que é diferente do resto?

A poesia é a pedra de toque, a razão de todo esse trabalho. Poesia é o próprio processo: a escrita, a edição, a criação de imagens comunicantes. É também o resultado desse trabalho, quando misteriosamente resulta.

-Criar imagens relacionadas com a literatura, capas ou outros trabalhos — como as bandas desenhadas que fazes a partir de poemas —, cria um outro universo, visual, a partir do verbal. Há mais de complementaridade, de iluminação naquele sentido etimológico da palavra «ilustrar», ou de novo mundo naquilo que fazes?

Procuro um difícil equilíbrio sempre a partir do amor pelo texto. A iluminação dada pelas imagens é algo que se oferece às palavras a partir dos novos mundos que elas nos trouxeram.

 

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