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Transcrevemos aqui um pequeno texto de Diana Chiu Baptista, com quem tive o prazer de viajar para a Índia através da Macro Viagens, por apontar características essenciais que façam conhecer o mundo e não somente a aparência do mundo (sejam elas em imagens ou “ondas” sociais). Não nos revemos em todos os aspectos, mas a súmula mostra-se mais importante do que os detalhes. Esperamos que possam usufruir, sem preconceitos.

«O que me move a viajar para a Índia? A Dulce desafiou-me a falar sobre este tema. E isso fez-me refletir. O verbo “ir” sempre fez parte da minha personalidade. Mas não é só isso. É isso e muito mais. A minha primeira vinda à Índia, não foi fácil: foi um murro no estômago. Mas esse murro transformou-se em borboletas na barriga. Não é fácil explicar, é mais fácil vivenciar a Índia…

A Índia é crua, é mundana e espiritual, é a vida como ela é, a céu aberto. Está tudo aqui, é tudo visível, o bom e o mau, não está nada camuflado.

A Índia mexe com as crenças, com a nossa visão da realidade. Abre-nos portas interiores que nem sabíamos que existiam, quanto mais que estavam fechadas.

A Índia é o epicentro espiritual do mundo, onde para além de lugares sagrados, encontramos sabedoria, linhagens, professores vivos.

A Índia é feita de gente que tem uma mente estável e flexível. Isso é visível no dia-a-dia. Basta descermos do nosso pedestal.

A Índia às vezes pode doer, mas é sempre bom visitar lugares que nos assustam, colocarmo-nos voluntariamente em situações desconfortáveis. A procura incessante de conforto de que padecemos no ocidente, conduz-nos invariavelmente ao sofrimento (irónico, não?).

A Índia é o mundo ao contrário. E vira o nosso mundo ao contrário. Pode motivar-nos a praticar, a estudar, a sermos mais éticos e compassivos, a procurar desiludir-nos com o samsara, a querer abandonar este ciclo incessante de renascimentos.

A Índia é uma vaca que entra numa loja, é o trânsito que parece que dança, são as buzinas a avisar “vou passar”, é alguém que se chega para a berma para dar espaço, é uma senhora de 70 anos que veste rosa brilhante com a barriga enrugada e grande orgulhosamente à mostra, é um sorriso aberto de um desconhecido, é um convite, são as famílias que vivem juntas, é um banco de comboio para cinco, é tanto que é difícil enumerar.

Se só pudesse vir a um sítio, vinha sempre à Índia. Aliás, deveria ser obrigatório todos virem à Índia uma vez na vida. Não ao Taj Mahal, não a Goa, não a Rishikesh, não a Jaipur (desculpem). À Índia. À Índia profunda que nos tira o tapete do chão e o substitui por um tapete voador.»

Patente de 1 de Abril a 10 de Setembro, esta selecção de livros pode ser visitada na Sala de Leitura do Centro de Documentação e Investigação Mestre Rogério Ribeiro, na Casa da Cerca em Almada. Transcrevemos aqui o texto da Folha de Sala que acompanha esta mostra.

«A Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian iniciou a sua colecção de livros de artista na década de 1990. Em permanente crescimento, esta colecção conta actualmente com 2978 exemplares já referenciados no catálogo.

Nesta colecção, que inclui a chamada “edição independente” (por vezes a sua fronteira com o livro de artista é muito ténue), encontram-se tanto obras únicas como múltiplos, de formato e tamanho diversos: livros impressos em offset, impressão digital e caracteres móveis, e livros que são inteiramente produzidos manualmente ou nos quais o artista teve uma intervenção directa na sua impressão, com tiragens que tanto podem ser centenas de exemplares como de menos de uma dezena. As tiragens podem ainda ser especiais, acompanhados de desenhos e/ou pinturas originais, gravuras e/ou serigrafias. Existém também livros editados por pequenas editoras alternativas ao sistema comercial. Embora a colecção tenha um âmbito internacional, o maior número de exemplares é da autoria de artistas portugueses, ou estrangeiros residentes em Portugal, de gerações várias, e reflectem a criação artística nacional a partir da década de 1960.

Sendo parte significativa e vital da cena artística contemporânea, tem vindo a ganhar cada vez maior importância quer pelo formato, que permite abordagens plásticas mais livres e experimentais, quer por questões de acessibilidade, quer ainda porque oferecem uma experiência personalizada, permitindo formas diversas de leitura e fruição, experiências interactivas únicas, invulgares, multidimensionais e multissensoriais. Não são objectos passivos – requerem um envolvimento directo de quem os manuseia.

Os livros de artista envolvem frequentemente investigação em múltiplas áreas, sendo utilizados pelos artistas como campo exploratório de novas formas e de expansão dos limites do seu trabalho, reflectindo perspectivas diferenciadas na sua criação. Estes livros não são limitados pelos formatos editoriais tradicionais. Como resultado, os artistas podem experimentar livremente diferentes formas, estilos, técnicas, materiais. Entra aqui uma dimensão profundamente política de questionar o mercado da arte, as práticas institucionais e o próprio sistema de edição comercial.

Estas obras transcedem os limites da arte: esbatem as linhas entre as artes visuais e a literatura, e representam uma fascinante intersecção entre arte e edição. Combinam texto e imagem, proporcionando uma nova forma de experimentar a narrativa e o próprio objecto livro.»

Sendo a décima sexta publicação efectuada pelas edições Quarto de Jade, este livro cruza-se no tempo com outro título desta chancela, nomeadamente aquando do desenvolvimento do livro Nagual que viu a sua génese na Cidade do México em 2007. Nessa altura, Diniz Conefrey conheceu a escritora e poeta Cristina Guillermo tendo esta partilhado com ele alguns dos seus contos para os mais novos. Destes contos, destacou-se particularmente O mundo circular de Marina como um projecto a ter a sua concretização em forma de livro ilustrado. Mais tarde, em Lisboa, o ilustrador sugeriu a Maria João Worm que delineasse uma paginação de base, que tivesse um carácter compositivo, sobre a qual as imagens deste livro fossem realizadas. Desta forma surgiram as ilustrações, cujas pranchas originais tiveram a sua conclusão no México D.F., entre 2014 e 2015, no âmbito de uma bolsa concedida pela Secretaria de Relações Exteriores do Estado Mexicano.

O mundo circular de Marina apresenta a narrativa de uma menina que tenta compreender a perpetuidade do mundo através de uma espiral onde nada se detém. O pensamento de Marina e das crianças, antes de criarem raízes socioculturais, não tem localidade. Tendo em conta este sentir, no qual a afinidade se conjuga naturalmente, sem constrangimentos, ligámos geografias. Demos espaço ao tempo para ser possível o encontro entre passado e presente. Nesse sentido, a linha gráfica das ilustrações complementam o texto através da escolha de uma linguagem visual sem carácter descritivo. Foi encontrada essa expressão através dos códigos e composições visuais de etnias indígenas – tanto da arte do passado como de artistas do presente – características da costa do Pacífico, no actual estado de Washington, dos Estados Unidos da América.

Encostando o ouvido, há quem ouça o mar dentro de um búzio. Essa casca – casa espiralada – teve um molusco que a habitou. Desapareceu mas o espaço onde existiu mantem-se. Haverá outro ser que indique, de um modo tão claro, uma permanência de parte de si numa forma propícia a um espaço aberto à revisitação?

Este livro, numa tiragem de 60 exemplares numerados, está disponível na Loja Quarto de Jade: http://www.quartodejade.com/shop_books.php

DUAS MEMÓRIAS

Enquanto prepara um novo livro de narrativa gráfica, a ser publicado este ano, transcrevemos uma parte da recensão de João Ramalho Santos ao livro Tu és os meus olhos, de Maria João Worm. Esta resenha foi publicada, originalmente, no Jornal de Letras, em Dezembro de 2021.

«O projecto editorial Quarto de Jade, de Maria João Worm e Diniz Conefrey, fez recentemente 10 anos de edições de qualidade, surpreendentes e inclassificáveis. A mais recente é Tu és os meus olhos, uma magnética obra em registo aparente de livro infantil, mas na qual Maria João Worm tece uma elaborada viagem iniciática (narrativa e de pesquisa gráfica), que oscila entre o mitológico e o pessoal, com toques simbólicos e surrealistas. Para o poder hipnótico do livro muito contribuem duas estratégias. Por um lado, a reinvenção constante de formas, quer citadas e metamorfoseadas em contextos diversos (mãos, diferentes objectos, colunas que podem ser de fumo, vento ou pensamento), quer reconstruídas utilizando diferentes componentes. Por outro, o uso de cores e espaço/fundo em branco (ou negro), nas quais as ilustrações parecem flutuar, ganhando uma qualidade simultaneamente frágil, diáfana e monumental, por vezes completando-se com o fundo, numa ilustração feita também de ausência.»

SUROESTE

Na continuidade da exposição Suroeste, realizada no MEIAC (Museo Extremeño e Iberoamericano de Arte Contemporaneo) entre Março e Abril de 2010, tendo decorrido em Badajoz sobre o mote de Relações literárias e artísticas entre Portugal e Espanha (1890-1936), tem vindo a marcar presença, sob a direcção de Antonio Sáez Delgado, esta revista  assumindo o mesmo nome do evento que lhe deu origem.

Contendo uma estrutura em redor de três secções temáticas, são várias as línguas ibéricas que aqui se exprimem para um aprofundamento, e maior conhecimento, da dinâmica actual de uma cultura transfronteiriça de realidades, senão comuns pelo menos partilhadas. Neste número 12, na secção de Ensaio, é publicado «A Arte de Escutar» de Diniz Conefrey, que teve a sua primeira edição neste blog. Maria João Worm participa na secção de Poesia com o poema «Roupa em Segunda Mão».

Muitos são os colaboradores que, ao longo de 168 páginas (e duas separatas) dão voz a esta publicação onde também se encontra patente uma secção de Narrativa. A edição pertence à Junta de Extremadura e à Fundación Godofredo Ortega Muñoz, onde estão disponíveis no site, para consulta digital, os números publicados anteriormente:

https://ortegamunoz.com/suroeste/

CIRCULAR

«Pouco a pouco vai anoitecendo, ouve-se o canto repetitivo dos insectos nocturnos e Marina, em cada salto, vai-se misturando um pouco mais com a terra, com o mesmo ritmo.»

O que distingue um livro ilustrado de um livro de banda desenhada? De que se trata quando nos referimos a um livro infantil? Qual a diferença entre o género alternativo e o comercial? Por serem relativas todas essas questões, continuamos a acreditar em livros de narrativa gráfica onde os leitores de diferentes idades possam criar laços de proximidade. Em mãos um novo livro que as edições Quarto de Jade preparam para ser publicado durante o próximo mês de Março. Do qual se dizia, quando o mês era áspero: Março Marçagão, de manhã inverno à tarde verão.

Remembering some moments of the voyage to the most relevant places of the Buda’s path, in India, which took place in October 2022, and was happily shared with an heterogenic and dedicated sangha.

All around the road we saw motorcycle princesses going on their way.

-What’s your name?

-Dennis.

-Where you come from?

-Portugal, southern Europe…

-There are many things to see here!

-We going north, to meet Buda places.

We saw sacred cows at Sanjay colony, a shanty town build by the population in the surroundings of New Delhi.

-My name is Naresh, the guide that leads you into this place.

-Can we take pictures?

-No, here is not permitted.

-Why not?

-This is not a tourist place, we must respect the dwellers.

(The streets were full of people and the smell was overwhelming).

Very often boys walk together with one hand leaning on the shoulder of the other. Or even holding hands can be a sign of their friendship.

-Do you have Camel cigarettes?

-No, only Marlboro…

-Let’s try another place.

-Never mind, I will try tomorrow morning.

-Give me your hand, so you don’t get lost.

(The streets in Varanasi were chaotic, with too many traffic and people moving around).

It was hot and the Ashoka Pilar stand with a smiling lion on is top. Here was accepted the inclusion of nuns in the Buda’s sangha, a poor region as Sanjay that we saw in Delhi, where the cast system is not relevant.

-This is the World Peace Stupa.

-Why it as also statues of the smiling lion?

-Because the Ashoka reign was the golden age of budism in India.

-But this is a Japanese stupa, right?

-Yes, it was built in the sixties, as a memorial of Japan atomic bombing.

(We look at the standing white pagoda rising the intention that similar wars won’t ever happen again in the world).

We were travelling further north when I felt involved by the sound of a Raga played by Shankar in is double violin.

It look like it was coming from the trees and mountains, as well from the heated mist elevating from the ground. And it seems that the pace of the bus carrying us was a tabla performing our hearts throughout an endless floating road.

https://www.youtube.com/watch?v=xrGJdoTNbSs

Above New Dehli’s Central Park several eagles were flying in large circles. We had already seen a considerable amount of monkeys in the garden of the hotel and its surroundings.

-Have you just seen it, there’s a lot of small squirrels in the trees.

-Last night I saw huge bats flying low, near the market.

-There are many street dogs sleeping on the ground or just wandering quietly.

-Just like the goats in the country villages.

-There are not only cows rooming everywhere.

(At Lodi Park a great number of geese stroll together near the lake in a loud array of acute sound).


Um livro é uma expansão delicada, reflectindo uma vivência para tocar quem o queira receber num espaço de encontro comum. Além do nosso site, os livros mais recentes que editamos podem ser encontrados nas seguintes livrarias:

Almedina – Lisboa e Coimbra

Baobá – Lisboa

BD Mania – Lisboa

Centésima Página – Braga

Dr Kartoon – Coimbra

Fnac – Várias

Kingpin Books – Lisboa

Ler Devagar – Lisboa

Stet – Lisboa

Tinta nos Nervos – Lisboa


									

 

A memória como contratempo exercido para que se fixe o que em si, naturalmente, segue em fluxo contínuo. A humanidade consegue fixar, registar. Escreve, faz incisões de gestos e atém. Prende ou, se quisermos, sustém. Julgo que o faz por contraponto ao volátil, tem medo do esquecimento, da morte. Usa as palavras que conjugam as pessoas num lugar de encontro partilhável. Entendível, desincriptável. Criou um modo de dizer que nomeia e, esperançosamente, o faz para que se entenda o propósito do inexplicável. Pode fazê-lo segundo uma tradição oral, ou fixar por inscrição: para ser lida. Duas formas de permanecer no espaço da memória.

Um livro é antes de mais um registo. Um pensamento que, ao apresentar-se para ser lido, supera a ideia de perda através da fixação. Nada garante que quem chega leia do mesmo modo como foi escrito, mas terá decerto uma leitura acertada com cada indivíduo, na sua intimidade. São de imensa acumulação os texto escritos. São demasiados e contudo belos nisso de serem vozes únicas de cada vez que se apresentam.

No caso da oralidade, que passa de uns para outros, fica sujeita a uma escolha e à delimitação do corpo que recebe a informação. Para mim fica mais leve e contemporâneo o que é dito. Será o testemunho do corpo em vida que o saberá fazer, ajustando-o à sua existência em continuação. Um upgrade vivêncial. Tarkovsky disse que os seus filmes seriam feitos apenas por estar em desequilíbrio com a vida, de outro modo a Arte não seria necessária.

Sugiro a leitura do livro «O Homem Livre» de Filipe Verde (Angelus Novus, Editora. Coimbra, 2008). Nele encontrei apoio no que tenho vindo a considerar como importante para sustentar a vida no meio de tantas vozes. Este livro aproxima-se dos Bororo e de como uma comunidade dita “simples” lida com a dualidade. Perante a anarquia da Natureza, onde também os seres humanos estão inseridos, através do corpo compulsivo que corresponde aos apelos da força natural e, ao mesmo tempo, a presença dos aroe: os espíritos que estão abertos à possibilidade de se pensar.

Participando o ser humano nestas duas vivências em simultâneo e interagindo entre elas, cabe-lhe um equilíbrio que decorre de regras segundo uma ética que faz juz à palavra. A palavra aparece como definidora de princípios éticos, que sustentam caudais de comportamento humano equilibrado.

 

UNIVERSOS

Foi com agrado que lemos na mais recente edição do JL, de 16 a 29 Novembro, uma recensão de João Ramalho Santos sobre o livro «Área», de Diniz Conefrey, da qual deixamos uma breve passagem:
«Com a sua tiragem microscópica e detalhado trabalho editorial, este é uma impressionante obra de autor, que, no entanto, nada tem do tom de satisfação autorreferencial que essa designação tende a implicar. «Área» é um livro multifacetado, cujos vários universos se metamorfoseiam, cujas camadas se vão revelando e interpenetrando em múltiplas leituras…»